8h00 da manha já eu estava a caminho da serra que me acarinha tanto e de todas as vezes que lá vou…
Cheguei já tarde ao Gerês, comecei no Arado e fui um pouco sem destino, aquela zona já tem poucos segredos para mim… e continuei a andar. Fantástico como cada paisagem, cada lugar, cada sitio tem um visual novo de todas as vezes que lá vou… Como se vestisse uma roupa nova todos os fins de semana… o seu mais belo traje de todas as vezes que a gente se reencontra. Caminhei pela Malhadoura, Tribela, Ponte de Serve, fui saudar o Cabana de Pinhô… Limpinha que ela estava, convidava a ficar ali, algo me dizia “tens de ficar… estou aqui…” Tenho de voltar lá e a promessa de uma pernoita naquela cabana foi feita…
Continuei em direcção ao Poço Azul, caminhei lentamente ao longo daquele vale, apreciei cada cume, cada fraga, cada pedaço de chão como se dois amantes se tratassem… daqueles que passam horas a contemplarem-se, acariciarem-se… a amarem-se… porque é assim que eu me sinto… O Coucão estava ali a desafiar me do olhar, atrevido e arrojado, nada lhe era obstáculo.
Desafiei-o do olhar para mim também não era obstáculo, só o tempo de o namorar um pouco mais, de o seduzir e quando ele já estiver rendido ao meu charme, ai sim vou até ele… A Roca Negra também ela espreitava, mais tímida, mais discreta mas tão imponente quanto o Coucão.
Quanto ao Alto de Arrocela, esse espreitava, altivo, impondo a sua presença… “Tonto… não me esqueci de ti… fazes parte integrante da vida que há em mim…”
Cheguei ao Poço azul sem dificuldade nenhuma. Ai não resisti estava muito bom e aquela lagoa estava mais sedutora do que nunca. Não hesitei um segundo, posei a mochila e desfrutei de um bom banho refrescante. Estava muito a vontade sabia que não estava ninguém por perto, não queria ninguém por perto queria estar só… Eu e ele… o Gerês... A Roca Negra e o Coucão vigiavam, certificavam que eu esteva segura, nada de ruim me podia acontecer… O Alto de Arrocela, apreciava a paz e o prazer com o qual me movimentada naquela lagoa. Testemunharam a minha paixão… o sentimento que deliciosamente me vai consumindo a alma… Algo me diz que ele está ali algures, naquele dia ele andava por perto como sempre, eu senti-o presente.
Estendi a minha manta, almocei e abandonei-me a um bom banho de sol. Depois de refrescar o corpo, deixei que o sol o voltasse a aquecer. Senti-o quente a percorrer cada pedaço de meu corpo… Delicioso…Divinal…
Após umas duas horas de namoro a contemplar cada encosta, cada cume e cada corga, resolvi tentar descobrir uns trilhos antigos para chegar a umas lagoas que já tinha visto ao longe o ano passado. Não foi muito difícil dar com o trilho… Dei-lhe a mão e deixei me guiar… levou me lá sem dificuldade nenhuma, parecia que toda a minha vida sempre conheci aquela serra… aqueles trilhos… aqueles lugares…
Tempo de regressar, como ainda era cedo resolvi ir dar um beijinho a Dna Zéza… Ainda bem que fui, encontrei me com uns Montanheiros de Montalegre acompanhados pelo Miguel Moura do blogue “Rotas do Barroso” www.rotasdobarroso.com/. Convidaram-me para me juntar a eles num jantar, ao qual aceitei. Acabei o dia em Montalegre, a volta de uma mesa muito bem acompanhada… de pessoas muito alegres, bem-dispostas e partilhando da mesma paixão.
Quero deixar aqui o meu muito obrigado ao Miguel pela forma hospitaleira a acolhedora com que me recebeu e ao Pedro pela simpatia, nunca me deixou sozinha, fazendo com que me sentisse peixe dentro de água.
Errata: Onde se lê Caucão deve-se ler Penedo Furado |
5 comentários:
Pois é!!! Não devias/deves ir sozinha prá serra....;)
Mas ela chama por ti..NÉ!!!. e não consegues resistir....sentimos isso nas tuas palavras..essa IMENSA PAIXÃO que tu sentes pelo Gerês... É LINDO..BOM DE SE LER :)))
PARABÉNS por não teres receio de demonstrar aquilo que tu sentes!!!
Bjs
Girafa
MInha Amiga,
Se vocês sentissem so um pouco do que eu sinto quando estou la, vocês tambem iriam...
Não consigo sentir medo, receio... sinto me muito mas muito em segurança... Na montanha so me acontece coisas boas... acredita no que te digo :):):) Tu tb ja testemunhaste essa paz e prazer que eu sinto...;)
Bjs ;)
De facto deves ser umas das pessoas que melhor conhece esta parte do PNPG. :)
Sempre com coisas novas.
Sobre caminhar sozinha tb já conversamos, mas eu percebo-te. Eu também já o fiz.
Um amigo meu fazia todos os anos a travessia para Pitões com o mesmo grupo de amigos de infância, normalmente nas férias escolares do Natal. Não gostavam de caminhar onde houvesse gente. Gostavam da ideia de estarem sós com a serra. Apesar de irem juntos, disse-me que chegavam a estar 2 horas sem trocar uma palavra. Apenas as necesárias enquanto caminhavam. As conversas ficavam para o local onde pernoitavam. Para os que o ouviam pareceu estranho, eu percebi-o. Eu em muitas caminhadas já fiz o mesmo. Por vezes precisamos de nos isolarmos para apreciar melhor o que está à nossa volta.
Miguel Torga escreveu sobre isso de muitas vezes. Deixo-te uma amostra:
"De resto, faz parte do meu ritual subir aos altos, sentir a voluptuosidade da fadiga, como diz Unamuno, e depois olhar. Devo à paisagem as poucas alegrias que tive no mundo. Os homens só me deram tristezas. Ou eu nunca os entendi, ou eles nunca me entenderam. Até os mais próximos, os mais amigos, me cravaram na hora própria um espinho envenenado no coração. A terra, com os seus vestidos e as suas pregas, essa sempre foi generosa. É claro que nunca um panorama me interessou como gargarejo. É mesmo um favor que peço ao destino: que me poupe à degradação das habituais paneladas de prosa, a descrever de cor caminhos e florestas. As dobras e as cores do chão onde firmo os pés foram sempre no meu espírito coisas sagradas e intimas como o amor. Falar duma encosta coberta de neve sem ter a alma branca também, retratar uma folha sem tremer como ela, olhar um abismo sem fundura nos olhos, é para mim o mesmo que gostar sem língua, ou cantar sem voz. Vivo na paisagem integrado nela. De tal modo, que chego a sentir-me, em certas ocasiões, pedra, orvalho, flor ou nevoeiro. Nenhum outro espectáculo me dá semelhante plenitude e cria no meu espírito um sentido tão acabado do perfeito ou do eterno. Bem sei que há gente que encontra o mesmo universo no jogo dum músculo ou na linha dum perfil. Lá está o exemplo de Miguel Ângelo a demonstrá-lo. Mas eu, não. Eu declaro aqui a estas fundas e agrestes rugas de Portugal que nunca vi nada mais puro, mais gracioso, mais belo, do que um tufo de relva que fui encontrar um dia no alto das penedias da Calcedónia, no Gerês. Roma, Paris, Florença, Beethoven, Cervantes, Shakespepeare… Palavra, que não troco por tudo isso o rasgão mais humilde da tua estamenha, Mãe! (Diário II)"
Como ele tu sentes a necessidade de te integrar na paisagem. Eu também tenho essa necessidade muitas vezes.
Joca, Meu Amigo...~
Admiro muito Miguel Torga, mas não conheço toda a sua obra e nunca tinha lido este texto...
Reflecte sim, na perfeição o que sinto e tu tambem. Mas por favor não me digam para não ir, não me retirem o unico grande prazer que eu tenho até hoje... Impedir-me neste momento de ir la cima... seria matar-me aos bocadinhos...
E a vida, essa...corre-me nas veias...
Abraço e obrigada pela tua visita e companheirismo. :)
Bom dia
Só agora regressei à civilização tenho andado por aqui e por ali.
Qdo vieres por Barroso já sabes, e não tens de agradecer.
Bj e boas caminhadas
Miguel
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